António Xavier sabe que estava destinado ao mundo da cozinha desde pequeno. “Eu ainda tentei ser advogado, tirar o curso de Direito, mas não estive sequer perto”, ri-se o jovem de 24 anos que assumiu há pouco mais de um mês a cozinha do Chez Chouette, após convite do chef Leopoldo Garcia Calhau. Não por falta de aproveitamento, já que era bom aluno a Português e a História, mas porque, na verdade, só havia escolhido Direito porque “para um jovem, saber que tem de abdicar dos fins de semana livres em hotelaria é chocante”, brinca.
Os resultados dos testes psicotécnicos haviam sido certeiros, corroborando a vocação que já se notava desde miúdo, quando, aos oito anos, pediu para fazer um curso de cozinha, no Porto. “A minha mãe é uma excelente cozinheira no dia-a-dia”, elogia. E o pai, António Lobo Xavier, também chegou a fazer uma incursão na área hoteleira, após o 25 de Abril. “Para um miúdo de Coimbra que nunca tinha bebido Coca-Cola, chegar a Amesterdão e descobrir o que era o bife tártaro e beber um negroni foi muito entusiasmante. Isso apaixonou-me”.

(Fotografia de Reinaldo Rodrigues/GI)

Ravioli de farinheira. (Fotografia de Reinaldo Rodrigues/GI)
Habituado a ler livros de receitas e a ver programas de cozinha – de Jamie Oliver a Marco Pierre White e Gordon Ramsey – António Xavier ganhou desenvoltura na cozinha. Na de casa e não só, quando começou a fazer caterings para amigos, sobretudo bifes Wellington. “Às tantas o meu pai disse-me que trabalhar duas vezes por semana não era vida e que me pagava o curso na Le Cordon Bleu, em Londres, se fosse mesmo o que queria fazer”. Antes, já tinha estagiado no Bocca, aos 19 anos, no Flow e no Belcanto, de José Avillez.
Quando regressou, fez um curso de vinhos com Manuel Moreira e começou a trabalhar no BouBou’s, sendo desafiado, com 22 anos, para assumir a cozinha do Portie, no Porto. Quando Leopoldo Calhau o convidou para ficar na cozinha do Chez Chouette, em Alvalade, não hesitou e é aqui que se sente como um peixe na água, atrás de um balcão aberto para a sala. Confessa, ainda assim, ser desconfiado de si próprio, tendo em conta a idade e o patamar que já alcançou. “Deixei crescer o bigode por causa disso mesmo”, humoriza.
Um prato outonal do chef
Folhado de bochecha de novilho com puré de couve-flor
Dando forma à cozinha luso-francesa do Chez Chouette, que Leopoldo Garcia Calhau fez questão de manter na passagem de testemunho, António Xavier resolveu inspirar-se num clássico, o bife Wellington, para criar este que é um dos 10 pratos do menu. “Sou maluco por massa folhada e por bochechas de vitela, então decidi fazer uma derivação do clássico bife Wellington”, explica o chef. A carne é estufada segundo a receita francesa e permanece no forno a 180 graus, durante seis horas, para se desfazer suavemente dentro do folhado. Ao lado surge uma meia-lua de puré de couve-flor previamente caramelizada em manteiga, sal e pimenta, coberto por um molho de carne. Sendo mais “leve e neutro”, exerce a função de equilíbrio com “os sabores radicais da bochecha e do molho”, explica António Xavier. É, no fundo, um “prato de conforto” outonal e um valor seguro no menu, ideal para quem não quer aventurar-se ou tem alguma restrição. E representa bem a cozinha de fusão do Chez Chouette (trocadilho com “C’est chouette”, “é giro”), algures entre a taberna e a alta cozinha.

Folhado de bochecha de novilho com puré de couve-flor. (Fotografia de Reinaldo Rodrigues/GI)
Tacos crocantes de alga nori com tártaro de vaca; puri de bacalhau pil pil e azeitona preta; crudo de lírio dos Açores em leite de tigre e pimentos amarelos; e alho francês com molho béarnaise são algumas das outras das criações do chef, ancoradas nos produtos sazonais. Para adoçar o final, há tarte tatin de pêra e bolo de bolacha feito com muito menos café e com bolacha Maria, receita que António foi buscar à avó, porque o avô não gosta do bolo em camadas. No espaço de aura industrial cabem ainda 100 referências de vinhos, cocktails e cervejas.
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