O tártaro de coração de boi pela mão do chef Miguel Castro e Silva

Continuamos com as receitas do chef Miguel Castro e Silva, desta feita com uma solução algo inesperada, mas de grande sabor e efeito. Tártaro de coração de boi.

No filme Ana e as suas irmãs, de Woody Allen, há um momento em que a propósito das emoções e paixões alguém diz que o coração é um músculo muito pequeno mas com uma grande capacidade de recuperação. Nós relacionamos desde sempre o coração aos sentimentos, mas na verdade devíamos dar-lhe o que verdadeiramente lhe pertence: a força da vontade e a determinação. Dizemos de um homem – ou mulher – bom e magnânimo que tem coração de boi, tudo perdoa e está sempre pronto. Já se vê que em termos orgânicos o nosso e o de qualquer bovino têm pontes óbvias.

Não só a vaca é um dos mais antigos parceiros do homem na lavoura e transporte como permanece em funções praticamente até morrer. Na cadeia alimentar, é das carnes mais tardias a incorporar, justamente pela utilidade e mais-valia enquanto braço forte dos movimentos e necessidades humanas. As peças mais valiosas, em termos de alimentação e culinária, são os músculos que exercitados ao longo da vida do animal têm menos tendões rijos e distendem e contraem de forma sempre hidratada e oxigenada. Isso levava os antigos a massajar alguns desses músculos com as mãos nos tempos de repouso dos animais. Assim se conseguia a regeneração, ou recuperação, ao mesmo tempo que se ia incorporando alguma gordura boa nas fibras das peças. Peças que após o abate se pode levar ao tratamento de maturação, que consiste, em condições controladas, em evaporar alguma água e destruir parte da estrutura proteica (aminoácidos), tornando a carne mais macia e apta ao consumo.

O coração concentra todas as virtudes dos músculos mais vigorosos e na idade adulta do bovino é praticamente desprovido de nervos interiores. Quase tudo se aproveita e sabendo dar-lhe a lâmina certa, extrai-se gloriosos bifes do coração.

O exercício permanente de contratura e distensão é já o processamento em cru que é preciso. Razão mais que suficiente para que o chef Miguel Castro e Silva, homem de coração de boi, se lhe aplicasse para extrair um tártaro, como só ele sabe fazer e temperar. São precisas duas mãos para pegar num coração de boi e é macio ao toque. Na boca, é puro prazer. Força e sensibilidade, no tal músculo que recupera rapidamente.

 

Tártaro Coração de Boi
320 g Coração de Boi limpo
80 g Puré de Aipo
Colher de chá de mostarda Dijon
Umas gotas de molho Inglês
Um pouco de sumo e raspa de Lima
Uma colher de sobremesa de Azeite
25 g de Parmesão ralado na hora
Cebolinho
Flor de Sal
Alfaces
Rebentos de rúcula
Batata roxa frita

Confeção
Corte em cubos não demasiado grandes e tempere com os restantes ingredientes.
Guarnece com a alface temperada e os rebentos. Finaliza com a batata roxa.

Nota
Para o puré de aipo coze a raiz descascada em cubos num pouco de leite com agua e sal. Escorre e passa em passe-vite.

 

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