Kasutera. O pão-de-ló japonês está de volta a Lisboa

No século XVI, os portugueses levaram pão-de-ló para o Japão. Os japoneses adaptaram a receita e fizeram dela uma especialidade local, o 'kasutera'. Agora, uma pequena loja em Lisboa traz o produto de volta à casa de partida.

Para contar a história da Kasutera, a novíssima loja dedicada ao pão-de-ló japonês que acaba de abrir no Poço dos Negros, é preciso recuar duas vezes no tempo. Primeiro, até ao século XVI, altura em que os missionários portugueses terão feito chegar a receita ao Japão, sob a designação Castella (não se sabe se por referência ao reino de Castela ou se por levar claras em castelo), adaptada pelos locais, no formato e no nome — kasutera. Depois, até ao final do século XX, altura em que um português, Paulo Duarte, decidiu aprender a fazer o verdadeiro pão-de-ló japonês em Nagasaki e abriu, em Lisboa, um salão de chá dedicado à especialidade que depressa ficou célebre, chamado Castella do Paulo.

Em 2013, o Castella do Paulo encerrou. Não por falta de clientes — pelo contrário, a casa era bastante concorrida — mas porque o seu proprietário sentiu a necessidade de um novo desafio: emigrou para o Japão com a mulher Tomoko e hoje gere uma pastelaria portuguesa em Quioto. Antes de ir, porém, fez questão de partilhar a sua receita de pão-de-ló japonês com Tiago Ferreira, um dos sócios da Conserveira de Lisboa, vizinho de longa data do pasteleiro. “O Tiago perguntou-me se não teria interesse em aprender a fazer o pão-de-ló e então começámos a produzi-lo, utilizando a fábrica do Paulo, na Amora”, explica Ingrid Correia, outra das responsáveis por continuar o legado.

No Kasutera vendem-se pães-de-ló japoneses na versão tradicional e de chá verde. (fotografia: Tiago Pais)

Até agora, Ingrid e Tiago vendiam o pão-de-ló por encomenda, através de uma mailing list, presencialmente na Conserveira de Lisboa e em alguns restaurantes japoneses, além de terem participado na Festa do Japão. Entretanto, Ingrid decidiu especializar-se na função e foi tirar o curso de pastelaria na Escola de Hotelaria e Turismo, já com a abertura de um espaço físico em vista. Encontraram-no no Poço dos Negros, numa antiga pastelaria com uma área generosa de cozinha e um pequeníssimo hall com um balcão. Não há espaço para consumir, apenas para comprar e levar.

Por semana saem 6 a 8 fornadas das duas variedades de kasutera, o tradicional (ovos, farinha, açúcar e mel) e o de chá verde, a que é acrescentado o dito, neste caso de produção nacional, o chá Camélia, produzido em Vila do Conde por Nina Gruntkowski, mulher do famoso produtor de vinho Dirk Niepoort. São vendidos em caixas de 300 e 600 gramas. Os preços vão dos 6€ aos 11€. “Por encomenda, podemos fazer com diferentes recheios e adaptá-lo a bolo de aniversário”, afirma Ingrid, que admite, no futuro, disponibilizar versões com saké e chocolate.

A pequena loja abriu em meados de novembro e fica no Poço dos Negros, em Lisboa. (fotografia: Tiago Pais)

O pão-de-ló japonês, explicam os responsáveis, é uma receita extremamente sensível, que exige afinações constantes. “Tivemos de ajustar a receita quando mudámos a produção da Amora para aqui só por causa da temperatura da sala”, exemplifica Ingrid. “Se no verão as galinhas bebem mais água, é preciso usar mais ovos. Há uma série de factores que podem mudar o resultado final”, acrescenta a responsável.

Ao contrário da maioria dos bolos, cujo período de forno deve ser respeitado sem sobressaltos, neste caso este deve ser aberto três vezes durante o período de cozedura (45 minutos) de forma a alisar-se a mistura no tabuleiro de madeira e garantir esta fica completamente homogénea. Depois de pronto, tem de aguardar seis horas até ser cortado por uma faca cuja lâmina é semelhante à das espadas dos samurais. “E só ao terceiro dia é que o pão-de-ló atinge o seu ponto alto, porque é quando os açúcares estabilizam”, garante Ingrid. O difícil é resistir-lhe até lá.

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