Epur: Alta cozinha no Chiado com vistas arrebatadoras

Três anos após a saída da Fortaleza do Guincho, Vincent Farges está de regresso, com um restaurante em nome próprio. Sem tendências, revelações ou reinvenções: no Epur, o chef francês faz aquilo que sempre fez, a busca pela essência dos produtos e o trabalho sem artifícios.

Vincent Farges regressou. O regresso após três anos de uma ausência que incluiu deixar o posto (e a estrela Michelin) na Fortaleza do Guincho, andar por outras latitudes e vasculhar Portugal de norte a sul. Ao cabo de tantas andanças, o chef francês voltou a assentar raízes, agora em Lisboa.

Na bagagem, não trouxe grandes revelações, mudanças drásticas de rumo ou tendências de vanguarda. Não, Vincent Farges não se reinventou nestes três anos; antes aprofundou aquilo que já fazia. Aquilo a que já nos tempos da Fortaleza do Guincho chamava de «cozinha sem mentiras». «As pessoas não têm de adivinhar o que estão a comer», dizia então e continua a dizê-lo agora.

Mais do que o fogo de vista, interessa-lhe a depuração, a integridade dos produtos, sem truques. E sem a veleidade de querer inventar a roda – basta reparar na manteiga servida no couvert. «É manteiga do Pico, uma ótima manteiga, não precisa de mais nada», explica. Não a emulsiona, não a incrementa com ervas ou texturas, apenas lhe junta um bom pão – artesanal, produzido na casa – e o resto é prazer que dispensa explicações.

A manteiga não está ali por acaso. Na volta do seu ano sabático a cozinhar em Barbados – «foram férias, basicamente», brinca –, Vincent passou um par de anos a depurar as ideias que tinha para o seu restaurante em nome próprio. Correu o país em busca de produtores, para criar uma rede com o mínimo de intermediários, gente diretamente ligada ao produto.

Hoje conta algo como noventa fornecedores, uma verdadeira dor de cabeça para o contabilista, mas um descanso para quem quer ter apenas o melhor sobre a bancada de trabalho. Tem uma queijaria que cura o queijo ao seu gosto, um produtor de rebentos de bambu no Alentejo, um apanhador de cogumelos que lhe consegue os cantarelos do tamanho certo, produtores de vinho que põem a paixão em primeiro lugar, um pomar apostado em citrinos fora do comum.

Ao entrar no Epur, primeiro dá-se de caras com a cozinha, do outro lado da parede de vidro. Ali, não há nada a esconder, ainda que a surpresa faça parte da ementa. Na lista não há pratos, apenas «ecossistemas», digamos: a escolha de produtos de estação é tónica dominante, pelo que o que está listado são elementos envolventes como «Água», para aquilo que vem do mar, «Horta», os «legumes da época sublimados», ou «Terra», com «o melhor das nossas serras», no capítulo de entradas. Nos principais, estão presentes o peixe e o marisco do dia em «Do mar ou do rio», as carnes e aves da época em «Do campo», e a revisitação de clássicos em «Recordações».

Pratos com lugar cativo, será escusado dizer, não os há. Mas há bons exemplos a reter: uma «horta» de ruibarbo marinado em calda, espinafre selvagem e outros legumes de primavera, puré de cédrat (citrino) e telha de linhaça que é todo um edifício de frescura e riqueza de texturas. Ou um «do mar» que faz assentar robalo braseado sobre vários prazeres vegetais: refogado de tomate seco, azeitona e favinhas, tomate confitado, funcho impregnado com caldo de legumes e anisados, cevada ao jeito de risoto.

A elevação dos legumes a mais do que mero acompanhamento, um ingrediente nobre, continua a ser um dos grandes trunfos de Farges. «É inato, aprendi com a minha mãe, ela preparava-os sempre de maneiras diferentes», orgulha-se. Faz tudo parte da sua cozinha sem mentiras.

Essa perspetiva cristalina verte-se também para o restaurante em si, que não faz mais do que espelhar a cozinha de Vincent: descontraído, porém sóbrio, elegante sem superlativos. Depurado, se preferirmos. Os tampos das mesas foram deixados a descoberto, para que se sinta o elemento madeira, os guardanapos são perfumados e entregues em mão, as loiças privilegiam a perfeição que há na ausência de uniformização. Tudo pensado para manter os sentidos atentos. E depois há a vista, com a cúpula dos Paços do Concelho em primeiro plano e o Tejo logo a seguir. Como se a perfeição precisasse de vistas arrebatadoras.
SALA PRIVADA
Além das duas salas de olhos no Tejo, há uma mais privada, de mesa corrida, onde cabem 12 pessoas. Não tem vista, mas uma câmara mostra, em tempo real, o que se passa nas ruas da Baixa.

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

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