Os países de origem estão em conflito há um ano, mas Oleksandr Kryvorotko e Anna Fedorova não podiam estar mais unidos: na vida pessoal, no trabalho e no apoio ao povo ucraniano. “Alguns clientes ficam surpreendidos quando percebem que somos um casal”, ri-se Oleksandr, que conheceu a namorada em Lisboa, para onde se mudou em 2016.
Ele tem 27 anos, é ucraniano, natural da pequena cidade de Kamianske, nos arredores de Dnipro. Em Kiev, estudou Psicologia, focada nos casos de crianças desfavorecidas ou vítimas de abusos. “Percebi logo que era uma área complicada. Tens que ser muito forte. Além disso, pagavam mal, Kiev era uma cidade cara e a família não me podia ajudar”, conta o jovem, que chegou a trabalhar numa cafetaria em Kiev. O dono desse espaço veio de férias a Lisboa e falou-lhe numa oportunidade de trabalho em Portugal. “Não conhecia nada, só sabia que existia Lisboa, o Cristiano Ronaldo e o Benfica”, conta, entre risos.
Ela tem 36, nasceu em Moscovo e está em Portugal há quase uma década. Desde cedo estudou em escolas artísticas e formou-se em Design Gráfico, mas há muito que sabia que iria sair da capital russa. “Sempre quis viver na Europa. Moscovo é uma cidade grande, com muitas pessoas, algumas são agressivas, não sorriem. É só trabalho, trabalho. Eu gosto de trabalhar, mas também gosto de viver”, revela Anna, que se apaixonou pelo sol e pelo povo amigável que encontrou em Lisboa, onde já morava uma amiga sua.
Conheceram-se num trabalho mútuo para a Fábrica Coffee Roasters, em Lisboa (ele na cafetaria, ela a desenhar os menus) e estão juntos há mais de dois anos. Ambos têm ainda família nos países de origem, e ambos apoiam a Ucrânia neste conflito. Aliás, Anna explica que, mesmo que a cidade de Oleksandr não tenha sido muito afetada pela guerra, é ela que dá “a força e o apoio” ao namorado, “sempre que ele precisa”, diz a ilustradora, que ainda hoje colabora com restaurantes e cafés, livros e eventos.
Em 2021, juntaram forças para criar a Go For Drinks!, um projeto sob-rodas onde vendem bebidas e petiscos. Aos domingos, é habito estarem na Lx Factory, mas são presença frequente nos mercados no Miradouro de São Pedro de Alcântara, Jardim do Príncipe Real e Praça Dom Luís I, além de festas particulares e eventos. Basta ir espreitando as redes sociais do projeto. Na sua banca, servem sangrias, cocktails (dos clássicos como a Margarita e o Bloody Mary e outros menos usuais, como o Spritz Ginja, que junta ginjinha, Spritz e espumante), além de limonadas de morango, gengibre ou pepino, sumos naturais e espetadinhas de queijos, presunto, salame e azeitonas.
Apaixonaram-se pela capital portuguesa, onde gostam de viver. Ele tem a proximidade da Fonte da Telha e da Costa de Caparica, onde dá asas à paixão pelo surf, sempre que pode. Ela destaca a amigabilidade das pessoas, a beleza da arquitetura, os tradicionalismos dos bairros históricos como Alfama, as flores e os espaços verdes da cidade. Sem esquecer a gastronomia. “Adoro polvo, marisco, peixe, mas toda a comida portuguesa é boa. E os vinhos, claro”, conta Ana. Em casa, vão misturando pratos portugueses e ucranianos, até porque existem bases em comum. “Em ambos os países, há muito puré, arroz, batata, carne, peixe…”, explica Oleksandr, que no seu percurso de barista passou ainda por espaços como o Manifest, em Lisboa, e o já extinto Café Progresso, no Porto. “A Anna faz muitas sopas ucranianas, por exemplo”, acrescenta o jovem. É o caso da borsch, à base de beterraba. Ajuda a matar saudades, mas Lisboa já os conquistou de vez. “Consigo viver toda a minha vida aqui”, remata o ucraniano.
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