Estriga no Martinhal Cascais: A repetição de um jantar irrepetível

A 12 de maio, o chef Daniel Estriga leva ao restaurante do Martinhal Cascais uma viagem de sentidos no mar, até Sagres. Um jantar de edição limitada, eventualmente irrepetível. Asseguradamente inesquecível.

Por vezes, acontece: aquilo que era irrepetível repete-se. Atenção, «irrepetível»; não se confunda com «irrevogável», que marcar passo não faz o género de Daniel Estriga. A convite do resort Martinhal Sagres, em março o jovem chef rumou ao Algarve para fazer um jantar de edição limitada. Na bagagem, em vez de se limitar a levar os pratos que já faz no seu restaurante – o Conceito Food Store, em Bicesse –, decidiu-se antes por criar de raiz um menu de degustação com todo o mar que apanhou pelo caminho, entre Cascais e Sagres.

Salto no tempo: o jantar foi memorável. No final da noite, de sentidos consolados, no ar ficou apenas a «fome» de uma repetição, porque um menu destes, embora sabendo que foi criado como experiência exclusiva e única, não merece ficar limitado ao arquivo de memórias. Pois em boa hora o Martinhal desafiou o chef para uma «desforra», desta vez no hotel de Cascais.

Impõe-se, portanto, um mapa da estrada que o chef percorreu nessa noite em março, para que se perceba o que estará implicado no jantar de 12 de maio. Sob o mote «uma viagem entre a Boca do Inferno e o cabo de São Vicente», o desfile desenrolou-se em seis pratos, além de amuse-bouche e da sobremesa, também eles de tema marítimo.

Cascais, ponto de partida, surgiu representada pelo polvo da linha, com o elemento principal trabalhado à lagareiro, de carne tenra e suculenta, sobre um surpreendente puré de abacate e lima, e uma emulsão de alho negro a acrescentar intensidade. Em Sesimbra, Estriga parou (literalmente) para trazer o espadarte, que serviu num tataki, profundidade de sabor, mergulhado em molho ponzu, gel de alga nori e salada de algas. Cebolo laminado e apontamentos de farinha torrada, evocação do alimento de pescadores, trazem sabores térreos, que puxam de volta à superfície.

O choco, embaixador de Setúbal, esse deu luta. Custou ao chef, palavras do próprio, uma noite de sono, a achar maneira de lhe resolver a textura. Solução complexa: marinado em limão e alho, depois cozido, frito e, por fim, braseado. No prato, mostrou-se guloso, ao paladar e à vista, com maionese de limão e alho e a tinta usada para moldar folhas crocantes e para fazer um falso carvão, tudo comestível e a acrescentar gosto.

Já em Porto Covo, Estriga trouxe à lembrança as férias de verão da infância. Uma massada de raia e lingueirão, incrementada com espuma de ouriço-do-mar e molho de pimento amarelo, lombo de sargo e folha crocante de arroz. Serve de adjetivo o que se passou de seguida: terminado o prato, a unanimidade exigiu que o tacho da massada fosse deixado sobre a mesa, para que nada se perdesse. Ainda pela costa alentejana, vieram à memória do chef as petiscadas em Milfontes, que recuperou em «Nem só de pão vive o Alentejo»: raia e fígado de raia, cozidos a vapor de molho Bulhão Pato, proteína intensa, balanceada com salada de canónigos, amêndoa laminada e pão frito.

Por fim, a viagem chegou ao cabo de São Vicente, com a «cavala do Infante». O peixe de águas locais, comprado no mercado de Sagres nessa manhã, o tempero a lembrar o extremo de Portugal continental como porto de partida para a epopeia das descobertas. Filetes de cavala braseados, salicórnia, rabanete laminado, gel de algas e um molho com base de caril, rico, especiado, envolvente.

Na sobremesa, Estriga foi «à pesca com Diogo Lopes». Da partilha de ideias com o pasteleiro do Penha Longa Resort nasceu uma sardinha de chocolate branco recheada de panna cotta de citrinos, crocante de sésamo a lembrar uma rede de pesca, «rochas» de bolo de chá verde, «areia» de areias de Cascais. Junta-se tudo e sabe, afinal, a mar. Fecha-se um mosaico no qual todas as peças encaixam sem esforço aparente.

A cada momento do desfile, resposta vínica à altura. Os vinhos Ninfa, que João M. Barbosa produz a curta distância das minas de sal-gema de Rio Maior, mostraram-se competentes para este diálogo com os vários atlânticos que se estendem entre Cascais e Sagres. Ou no sentido inverso, agora que a viagem de Daniel Estriga desagua a um pulo da Boca do Inferno.

O jantar De Cascais a Sagres pela costa acontece a 12 de maio, no hotel Martinhal Cascais. O preço, com harmonização de vinhos incluída, é de 70 euros por pessoa.

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

Veja também:

Um jantar com muito mar no Martinhal Sagres
Um cinco estrelas familiar na Quinta da Marinha




Outros Artigos





Outros Conteúdos GMG





Send this to friend