Crítica de Fernando Melo: serra, cidade e campo à mesa do Tombalobos

Pétalas de toucinho, no restaurante Tombalobos. (Fotografia de Paulo Spranger/GI)
Quando vamos, apontamos a mira para o centro de Portalegre e quando regressamos, vimos de uma experiência sempre irrepetível, tais os cuidados e muitos talentos do chef José Júlio Vintém, no Tombalobos. Rusticidade autêntica e bem-vinda, cardápio extenso e rico.

A primeira bandeira está nas pétalas de toucinho, o clássico por que todos vamos ao templo culinário de Portalegre. Trata-se do mais belo demonstrador de sofisticação a partir das mais simples partes do porco. O trabalho matricial e genial do chef Vintém desenvolvido em tudo o que é vísceras é já apanágio seu. Há sempre uma declinação imprevista das ditas à nossa espera. O sedutor e inquieto cozinheiro não resiste a desafiar-nos.

Numa vertente entradeira mais canónica, damos com estas joias: croquetes de vitela com caril, alternativa mais que válida à vezeira mostarda, consistência perfeita; perdiz de escabeche (17,50 euros), a conserva ácida é equilibrada e sápida; e pezinhos de coentrada com pão frito (10 euros), sempre sublimes. Estamos numa zona de clara matriz mediterrânea, o mesmo é dizer caldos e pão, e tem de pontificar a sopa de tomate, orégão e ovo escalfado. Espantoso o equilíbrio. A sustentabilidade está há décadas no pensamento de José Júlio e a sua contribuição para a valorização do peixe do rio é louvável. Destaco neste capítulo o lucioperca com batata-doce salteada, explosão de sabores e acerto matemático de temperos. Excelente para lavar o preconceito que persiste em relação ao pescado de água doce.

Entramos nos pratos principais e da experiência privilegiada da prova da maioria do cardápio, entrego-me ao cozido de grão com hortelã (18 euros), triunfo do receituário local, execução inefável aqui. Não dispenso o arroz de perdiz com ostras (22,50 euros) quando há e sou fã incondicional da língua de vaca panada com migas de batata (18 euros); uma maravilha, sabor e texturas bem sintetizadas a partir de uma parte mole que não é favorita dos portugueses. Cresci apartado da língua estufada por nunca me ter sido apresentada com esta execução primorosa, pode bem merecer a viagem só para aferir a sua correção. Ir em grupo será mais rentável e dá para provar mais. Ou ir muitas vezes para alternar o prato com que se encerra a empreitada salgada, se com borrego assado no forno, se com empada de lebre (18 euros).

São ambos clássicos bem confirmados do chef José Júlio Vintém. Quanto à doce terminação, também não ficam os créditos por mão alheia. A sugestão é tripartida, e vai para o fartes, glória da doçaria conventual de Portalegre, encapsulada em folha de obreia e servida fatiada; torrão real (6 euros), que dificilmente se encontra com o primor necessário; e bolo de chocolate 85% cacau com bola de gelado (6 euros). O tempo passa depressa neste reduto copioso do norte alentejano, melhor será ficar para o dia seguinte. Que é a melhor desculpa para voltar.

A refeição ideal
Pétalas de toucinho (8,25 euros)
Croquetes de vitela com caril (12 euros)
Sopa de tomate, orégão e ovo escalfado (6,20 euros)
Lucioperca com batata-doce salteada
(18 euros)
Borrego assado no forno (19,50 euros)
Fartes (6,50 euros)

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.




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