Crítica de Fernando Melo: Restaurante da Quinta da Comporta

Crítica de Fernando Melo: Restaurante da Quinta da Comporta
Não temos na nossa prodigiosa língua tradução para “serendipity” e é exatamente o que acontece quando damos com o magma imanente que a cozinha do hotel Quinta da Comporta, no Carvalhal, instalou e passa de forma orgânica a todos os que se sentam à mesa do seu restaurante.

Tem menos de 200 anos o termo que nos permite concentrar surpresa, bondade e felicidade para descrever aquele lugar que procuramos sem saber e que depois de encontrado nos eleva e faz maiores. Não é difícil dar com o hotel Quinta da Comporta, apesar da simplicidade quase minimalista da receção, que quase nos faz passar sem perceber que é ali. Contraponto salutar do sistema clássico, que rapidamente nos põe no espaço do restaurante. Governa os fogões o chef João Sousa, vindo do Vila Vita Parc, em Alporchinhos, onde chefiou o restaurante Atlântico, cerca de sete anos a consolidar saberes para chegar à autonomia intelectual e de organização que disponibiliza no atual posto.

A lógica da sua cozinha assenta no máximo de produto próprio – há uma horta biológica – e explora a fundo todas as proximidades – peixe, marisco, carne e legumes – para proporcionar à mesa a mesma harmonia que o hotel proporciona. O restaurante trabalha com duas cartas, almoço e jantar, e recebe de igual forma passantes e ficantes, renunciando totalmente à designação de certa forma pejorativa de restaurante de hotel.

Saladas e pratos ligeiros disponíveis para quem procura frescura e leveza ao almoço, caso do brilhante ceviche do mar (18 euros), composto por peixe do dia, algas e puré de abacate, com a assessoria de chips de batata e batata-doce. O tratamento cítrico que dá nome ao prato a buscar equilíbrios de sabores e texturas, marca de resto do chef nas suas abordagens. Optei pela presa de porco alentejano (26 euros), pondo à prova o trabalho de fogo que é dado à peça, desafio inteiramente superado. A presa não é peça fácil de processar e chegar com a tenrura que apresentava é notável. Boas batatas fritas com especiarias, a enriquecer a experiência e a puxar pelas mãos para a exploração. Fechei a experiência almoçante com tarte de limão merengada (8 euros).

A luz exterior dá lugar ao conforto da luz interior quando chega a hora de jantar. A coreografia de serviço permanece, com a juventude do espaço ainda a fazer-se sentir em pormenores mas nunca prejudicando a experiência. Inesquecível o lavagante azul do Atlântico (22 euros), declinado com caril tailandês, texturas abrilhantadas por frutas tropicais. Tive vontade de repetir, não fora a expectativa grande sobre o resto da experiência.

Dito e feito, que a etapa seguinte foi de truz. Filete de robalo com arroz cremoso de camarão, flor de açafrão e algas (28 euros), enorme e longa vénia ao chef Sousa, feiticeiro de equilíbrios e respeito absoluto pela integridade do peixe. Genial o prato de porco ibérico aqui chamado de porco preto 3D (28 euros), composto por bochecha estufada, presa grelhada, pipocas, as três preparações anunciadas a concretizar-se com o mesmo rigor que o peixe, o que é raro. E que bem sabe ver a nobreza com que uma proteína assim forte é tratada. Está criado um destino obrigatório para os amantes da boa mesa e que mesmo na exigente e lauta extensão restaurativa do Carvalhal e Comporta distingue-se pelo brilho e harmonia. Há mesmo ouro neste lado do arrozal.

 

A refeição ideal:
Foie gras e figo (22 euros)
Carpaccio de peixe (14 euros)
Filete de robalo com arroz cremoso de camarão (28 euros)
Porco preto (ibérico) 3D (28 euros)
Terra de chocolate (14 euros)

 

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

 

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