Crítica de Fernando Melo: Mapa, Montemor-o-Novo

(Fotografia: DR)
Por vezes, acontece sermos guiados por uma espécie de desígnio superior e colocados no local certo. Aconteceu com o chef David Jesus, que da forma mais improvável foi conduzido até ao lugar da sua plena realização. Foi com muito prazer que me sentei à mesa no restaurante do L’And Vineyards, em Montemor-o-Novo, que dá pelo nome de Mapa. Pois claro.

David Jesus nunca foi de muitas palavras, é um chef mais orientado para a ação sempre com força e vigor, à maneira da tropa especial. O tempo que passou na liderança da brigada de José Avillez mostrou bem aquilo de que era capaz, mas nem por isso teve a pressa de assumir o comando. Esse momento chegou agora, em Montemor-o-Novo, no restaurante Mapa. Foi bom encontrá-lo realizado, dono do seu tempo e orientado para o seu próprio projeto, que não podia senão ser profundo e abrangente. Sentou-se comigo à mesa e só muito raramente foi à cozinha para dar continuidade ao fluxo suave e tranquilo de trabalho da sua brigada. A experiência foi sideral, a toada sempre tranquila.

O Menu Caminhos revelou-se o mapa íntimo do chef, cada prato uma referência geográfica, com cada referência por sua vez a apontar o ingrediente-chave e o código de exploração dos sabores, aromas e texturas. Começámos por Moçambique, com a proposta de gamba da costa servida com a típica matapa (folha de mandioca), orlada de coco e amendoim, sabores muito assumidos e presentes. Maria Rebocho na direção de sala e Pedro Durand na coordenação vínica, a coreografia foi sempre impecável e descontraída. Caldo de grande talante, apetecia repetir. Fez maravilhas o rosé madeirense do Porto Santo. Altura de partir até ao Japão, com a proposta maravilhosa de atum dos Açores, a proteína exposta junto a apontamentos de tempura e algas. Branco de talha glorioso, assinado por Susana Esteban. Salinidade bem-vinda, prato com muita definição e frescura.

O menu do Mapa viaja por territórios com ligação histórica a Portugal. (Fotografias: DR)

O chef mostrou as suas raízes goesas no prato seguinte, um xeq-xeq de carabineiro do Algarve de antologia, brilhantemente assessorado por maçã verde e salicórnia. Brilhante foi também a maridagem com um branco bairradino de Luís Pato, Parcela Cândido. Pensava que tínhamos chegado ao pináculo do sabor com este magnífico prato, mas eis que é servido o salmonete de Setúbal que desafiou toda a lógica. David Jesus evocou o Brasil neste prato, mas levou um xerém de finíssimo recorte, berbigão da ria e o que ele chamou sabores de moqueca. Genial. Genial também o vinho do mago Márcio Lopes para acompanhar. Chega o momento da Índia no leitão crocante com beringela fumada e cebola roxa ácida, a que Pedro Durand em boa hora entendeu chegar o desafiante Natus, criação recente de Hamilton Reis.

A empreitada terminou com derradeiras passagens pelo Reino de Sião – manga, arroz e coco – e Índia – bebinca, café e rum. Está feliz o chef David Jesus, estamos todos nós felizes.

O chef David Jesus.

A refeição ideal:
Menu Caminhos (140 euros)
Harmonização de vinhos Portugal no Mapa (150 euros)
Snacks
Gamba da Costa, matapa, amendoim, coco (Moçambique)
Atum dos Açores, miso, tempura, algas (Japão)
Carabineiro do Algarve, xeq-xeq, maçã verde, salicórnia (Goa)
Salmonete de Setúbal, xerém, berbigão da ria, sabores de moqueca (Brasil)
Leitão crocante, tempero de espeto, beringela fumada, cebola roxa ácida (Índia)
Manga, arroz, coco (Reino de Sião)
Bebinca, café, rum (Índia)

Avaliação:
Sítio – 5/5
Serviço – 5/5
Comida – 5/5

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.



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