Crítica de Fernando Melo: O Paparico, Areosa

Sérgio Cambas é um criador livre e propõe um Portugal ousado à mesa de O Paparico, restaurante que se faz valer dos sabores nacionais, há já 10 anos na Areosa, no Porto. Uma crítica para ler de Fernando Melo.

Crescer é ciência complexa, na vida e no trabalho. Na restauração é até discutível, pelas pontas económica, financeira e social que convoca e literalmente põe à mesa. Salva o cenário a palavra «hospitalidade», que é o centro gravitacional de toda a atividade restaurativa. Sérgio Cambas ainda não tem 34 anos e já sabe quase tudo sobre o assunto há muito tempo.

Praticamente nasceu no café-restaurante dos seus pais, na Póvoa de Varzim, espécie de fio condutor dos primeiros anos da sua vida profissional. Ponteou-a a gosto e de acordo com o curso de vida desde que, aos 14 anos, teve a moção de se autonomizar como ajudante de padeiro numa casa de banquetes, nos fins de semana.

Aos 16, colabora com o primo na abertura do Manjar dos Leitões, na Póvoa, de especialidade evidente e paixão que nunca mais deixou abrandar. Abraçou de vez a vocação quando assumiu com o pai a Taverna Yuko, no Porto, uma casa de pasto que ainda hoje existe. Aí, serviu à mesa e trabalhou na cozinha, completando os estudos secundários ao mesmo tempo. Depois estudou, dentro e – muito – fora de portas, fez-se o bravo empreendedor que hoje conhecemos, até que ao vir ao Porto para as bodas de prata dos pais soube que a casa ao lado da Yuko estava disponível. Nascia o Paparico, faz agora 10 anos, tinha o rapaz 23. Quatro anos depois, foi a vez de abrir a cervejaria Brasão, aos Aliados, e no ano passado abriu a do Coliseu.

Sentamo-nos no Paparico como sempre, em festa e tranquilos, prontos para uma viagem sem retorno. Oficiam na sala José Araújo e o escanção Rui Costa, ambos bem, na cozinha o jovem chef francês Jonathan Seiller, seguimos todos juntos na Portugalidade, menu que propõe e executa com genialidade o voo rasante por todas as regiões portuguesas, declinando ciência culinária e culto do sabor como poucos até hoje. Sérgio Cambas não tem prisões emocionais, é um criador livre e propõe à mesa um Portugal ousado. Produto de origem, processamento respeitador e fusão de técnicas e influências para montar a tese de sabor nacional. Não há um apenas, mas muitos.

Caldo de cebola e queijo São Jorge, Açores; petiscada de ostra do Alvor; atum dos Açores; bacalhau à Brás, Lisboa; tártaro de vaca velha minhota; Bulhão Pato frio da Estremadura; robalo selvagem com xerém; arroz malandro de lavagante azul; salmonete com chocos e migas à alentejana; jardineira de rabo de boi; escabeche de perdiz; e ovo mole. Menu de 120 euros por pessoa, 70 euros mais se se optar pela excelente harmonização vínica proposta. No serviço à carta, fazemos uma viagem diferente, à medida da bolsa e da vontade de comer de cada um. A experiência de luxo feita à medida. Apaparicados no Paparico, como merecemos num dia de glória à nossa escolha.

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

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