António Saramago: “A enologia é uma ciência que requer muita paixão”

António Saramago trabalha há seis décadas no mundo dos vinhos (Fotografia de Leonardo Negrão/GI)
Com 60 anos de carreira, Saramago é o enólogo mais antigo em atividade em Portugal. Para celebrar a data, foi convidado a apresentar alguns vinhos na sétima edição lisboeta do Enóphilo Wine Fest, que decorreu em abril.

Começou a trabalhar muito novo no mundo dos vinhos. Como foram os primeiros tempos?
Trabalhei 50 anos numa grande empresa, entrei lá aos 14 anos. Nos anos 1970, fui estudar para Bordéus. Na altura, não havia enólogos em Portugal. Adorei estar lá. Tive como professores grandes enólogos como Peynaud e Pascal Ribéreau-Gayon. Percebi que não sabia nada. Foi começar do zero. Depois, voltei à empresa onde trabalhava e nessa altura não me sentia satisfeito com o que fazia.

Foi quando começou a fazer projetos diferentes.
Sim. No Alentejo, criei o Tapada de Coelheiros. Plantei Chardonnay, casta que ninguém plantava lá. No início, toda a gente me chamou maluco. Depois, as pessoas diziam que eu fazia o melhor vinho do Alentejo e o melhor Chardonnay de Portugal. Também plantei Cabernet Sauvignon e Merlot, quis fazer um vinho parecido com Bordeaux.

O vinho nasce na sua cabeça, antes de nascer na adega.
Sim, tenho sempre um objetivo. Também já me enganei muitas vezes, mas se calhar menos do que acertei.

Também defende as castas nacionais, como o Castelão. Até é conhecido como Sr. Castelão.
Todas as regiões têm a sua identidade. O Dão tem a Touriga Nacional e nós, em Setúbal, o Castelão. Gosto de trabalhar essa casta e desenhar vinhos diferentes.

Há 14 anos que faz vinhos na vinícola Villaggio Grando, em Santa Catarina, no sul do Brasil. Como tem sido essa experiência?
Cada país tem a sua forma de olhar para o vinho. No princípio, senti alguma dificuldade porque era um mundo diferente. Os solos e os microclimas são diferentes. Tem sido uma aprendizagem muito boa. E se lá estou há 14 anos é porque gostam do meu trabalho. Um dos espumantes que lá fiz ganhou o prémio de melhor espumante brasileiro.

O que é necessário para se ser um bom enólogo?
Experiência e talento. A enologia é uma ciência que requer muito trabalho e paixão, muitas horas a falar com o vinho. E é importante ter memória gustativa e olfativa. É preciso provar e beber os melhores do mundo. Provar bem é muito importante.

O que lhe falta fazer como enólogo?
O meu caminho está curto, sinto isso. O único vinho que não gostava de ir embora sem mostrar é uma homenagem aos meus quatro netos. Foram as melhores criaturas que o mundo me deu. Fiz mil garrafas, 250 para cada um. É de 2014 e vai chamar-se Sucessão. É 100 por cento Castelão. Não tenho pressa. Mas quero que me digam que este vinho é especial.


ANTÓNIO SARAMAGO VINHOS

Nascido há 75 anos, em Vila Nogueira de Azeitão, António Saramago já foi responsável por dezenas de projetos. Há 20 anos, criou uma marca própria, na sua terra natal, com os filhos António, também enólogo, Nuno e a mulher, Ausenda. Produz aqui vinhos, onde se destaca a casta Castelão e Moscatéis de Setúbal.

Web: asvinhos.com




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