Dez vinhos para uma Páscoa bem regada

A E
O crítico Fernando Melo sugere 10 com "pedigree". (Fotografia: Markus Spiske/Pexels)
Aqui ficam as nossas sugestões para uma mesa pascal bem real, ainda que distante dos nossos mais chegados e queridos. É tradicionalmente a festa maior da família alargada, todos são sensíveis ao toque a reunir e à refeição mais longa. Há novidades no mercado, tantas que optámos por deixar a doçaria copiosa desta época para outro momento. Boas provas! Boa Páscoa!
17,5 – Mingorra Reserva Alentejo tinto 2016 (14%) | Herdade da Mingorra – 14 euros

Alfrocheiro, Alicante Bouschet, Syrah e Touriga Nacional. Fermentação tradicional de curtimenta em lagares de temperatura controlada a 25ºC, após maceração a frio. Extracção contida, não há qualquer nota de sobre-extracção na boca, antes se sente um ambiente geralmente fresco e equilibrado. Estagiou 12 meses em madeira de carvalho francês. O tempo de estágio em garrafa afinou os componentes entre si, a mão sábia do enólogo Pedro Hipólito proporciona também o toque de modernidade de que o Alentejo precisa e merece. É mesmo um grande prazer provar este vinho, copioso na entrada, evolução muito lenta no palato, abrindo notas balsâmicas e especiadas, para terminar fino e elegante, ligeiramente salino. Um vinho que merece repouso em cave pelo menos mais dois anos. A estrutura bem urdida e o excelente equilíbrio do vinho elevam a fasquia da expectativa à mesa. Por isso vamos dar-lhe um estufado longo de perdiz, bem acarinhado por um copioso gratinado de batata à moda da Sabóia.

 

18 – DIscórdia Reserva Alentejo branco 2019 (13,5%) | Edual – 17 euros

Arinto (65%) e outras castas brancas. Fermentação e estágio em barricas de 500L de carvalho francês. Uvas da Herdade Vale d’ Évora, solos xistosos e magros de Mértola, incrustados no parque natural vale do Guadiana. Trabalho notável do enólogo Filipe Sevinate Pinto neste pedaço de território raiano mais a sul. O empresário Víctor Pereira, proprietário da herdade, tem uma comunicação boa com o seu enólogo, pelo que de discórdia o vinho tem apenas o nome. É o resultado conjunto da boa delegação e do talento; não é fácil produzir vinhos frescos como este numa zona tórrida na altura da vindima. Aromas cítricos pronunciados, laivos tropicais, com traços até de talo de couve e rama de tomate. A boca é empreitada monumental, o vinho cobre e conforta à maneira do manto de seda, ao mesmo tempo que liberta trufa preta, cogumelos frescos e um exotismo pouco comum entre nós. Final longo. Excelente parceiro para o ensopado de borrego.

 

17,5 – Encostas de Sonim Grande Reserva Vinhas Velhas Trás-os-Montes tinto 2016 (13,5%) | Encostas de Sonim – 15 euros

Vinhas Velhas, com a correspondente mistura de castas, em Valpaços. Esmagamento ligeiro para lagar tradicional aberto onde fermenta durante vários dias. Estágio de 18 meses em barricas de carvalho francês. Fernando Pessoa é um grande transmontano de coração gigante, juntamente com a sua filha Dina e o genro Hélder Martins tem sabido fazer sempre diferente de todos, e ao mesmo tempo seguir os passos dos antigos. Abordagem minimalista, enologia do genial Francisco Montenegro, entendimento perfeito entre produtor e enólogo, bom exemplo. De cor retinta, aromas de ginja madura e esteva, na boca mostra taninos finos e firmes, dando a impressão de ligeireza. Viaja devagar e termina elegante. Excelente para o cabrito assado.

 

18 – Quinta Monte d’Oiro Reserva Lisboa branco 2018 (13%) | José Bento dos Santos – 20 euros

100% Viognier, como em Condrieu, a única região vitícola do mundo estritamente dedicada à casta e que desde o início preenche a fantasia de José Bento dos Santos. Fica no extremo norte do vale do Ródano, aliás como Saint-Joseph, onde medra impante o melhor Syrah, outra paixão também trazida pelo empresário visionário para a sua muito querida Ventosa. Graça Gonçalves lidera com garbo a enologia da casa, Francisco Bento dos Santos tem a seu cargo a gestão e coordenação das operações. Um bom Viognier tem naturalmente forte carga aromática floral, mas sem exuberância excessiva, e na boca é sobretudo mineral; a fruta surge depois de uma cápsula imaginária abrir no contacto com a língua e preza-se mais o equilíbrio que a copiosidade. É exactamente esse o perfil desta edição mais recente do porta estandarte da quinta em matéria de brancos. Irá muito bem com galo assado no forno.

16,5 – Dona Maria Viognier Alentejo branco 2019 (13%) | Júlio Bastos – 10 euros

100% Viognier, enologia de Sandra Gonçalves. É a edição mais recente deste monocasta, cuja expressividade impressiona desde o início da “aventura Viognier”. Dá-se incrivelmente bem nos solos clássicos da Quinta do Carmo de Júlio Bastos e o carinho que é posto na produção do vinho é mais que justificado. Trata-se de uma casta que os portugueses ainda conhecem talvez menos bem mas que além de personalidade marcante em lotes consegue excelência à mesa. Aromas tropicais pronunciados, juntamente com impressões de vagem verde de favas. Na boca é eminentemente cítrico, mostrando notas de pastelaria e especiarias que tornam o conjunto muito cativante. Ideal para coelho com alecrim.

 

16,5 – Monólogo Avesso Verdes branco 2020 (13%) | A&DWines – 7,50 euros

100% Avesso. Uvas da cota mais baixa (180metros) da Quinta de Santa Teresa, em Baião. A vindima neste ano foi bastante difícil, marcada por adversidades e intempéries diversas, mas que o tempo em garrafa conseguiu integrar bem. Não teve qualquer contacto com madeira e no entanto apresenta complexidade invulgar, especialmente quando se trata de um monovarietal de uma das mais caprichosas castas nacionais como é a Avesso. O nome, de resto, atesta justamente isso. Aqui temos as inevitáveis notas extractivas de pêra madura, dado o ano “impossível” de que falamos, mas tem um edifício mineral atraente e que acaba por dominar. Tem tudo para envelhecer harmoniosamente por meia dúzia de anos, se conseguirmos esperar por ele. Não sendo o caso, será grande companhia de bacalhau à lagareiro.

 

17 – Regateiro Reserva Bairrada branco (12%) | Ares da Bairrada – 8,50 euros

Castas típicas da Bairrada. A marca corporiza sempre vinhos de homenagem a antepassados de Casimiro Gomes, e no universo Lusovini é produzida por empresa autónoma. A biónica Sónia Martins produz com especial carinho este branco de grau alcoólico moderado, dando a conhecer uma Bairrada diferente, berço também de vinhas velhas brancas, a que devemos dar mais atenção. Aqui encontramos um perfil fresco e equilibrado, notas minerais salinas e balsâmicas de folha de eucalipto, com raspa de citrinos em primeiro plano. À mesa pede leitão assado à moda da Bairrada.

 

16 – Pousio Selection Alentejo rosé 2020 (12,5%) | Casa Agr. HMR – 6,50 euros

Aragonez, Trincadeira e Touriga Nacional. Cor rosada nacarada, ligeiramente mais aberta que a da maioria rosés do mercado. Aromas de figos secos, chocolate branco e cerejas maduras. A prova de boca é uma agradável surpresa, pois dá conta de um vinho estruturado e pronto para a boa mesa, bem para lá da toada festiva do consumo ocasional. Para este rosé, apetece cozinhar, porque reage bem tanto a gratinados como a marisco, e não se faz rogado perante um bom peixe assado. Esta casa tem sabido povoar a zona relativamente pouco visitada dos vinhos alentejanos de perfil moderno, elegantes e equilibrados.

 

17 – Despertador Algarve rosé 2019 (12,5%) | Paulo Trindade – 20 euros

100% Negra Mole. Estágio em barricas usadas de carvalho francês nas quais anteriormente fermentou e estagiou Chardonnay. Este condicionamento deixou a madeira menos invasora, transmitindo a recasando com eficácia polifenóis presentes, ao mesmo tempo que permitiu criar mais elegância em boca. Nos três primeiros meses estagiou em barrica sobre as borras finas, o restaurante trabalho de estágio aconteceu em inox. O resultado é francamente saboroso e a eficácia à mesa é grande, este rosé gosta de desafios e tem estrutura bastante para enfrentar peixes fumados, saladas ricas em tomate e frutos secos. Excelente ainda com pratos étnicos fortemente condimentados e picantes, caso de caril de frango à goesa, sempre bom para receber de forma imperial a família.

 

18 – Quinta da Casa Amarela Reserva Douro tinto 2015 (14,5%) | Laura Regueiro – 25 euros

Touriga Franca, Touriga Nacional e Tinta Roriz. É sempre com grande emoção e expectativa que provo uma nova edição deste título duriense absolutamente fundador. Todos devemos a esta casa o maravilhoso Reserva 2003, feito então por Susana Esteban e que ainda hoje resiste sem beliscadura à prova comparativa com a esmagadora maioria dos tintos durienses, incluindo os títulos mais recentes. Acontece que este exemplar notável de 2015 fez-me literalmente viajar no tempo, até 12 anos atrás. Equilíbrio acidez-taninos notável, taninos muito finos a construir uma estrutura indestrutível, e persistência interminável. A vénia a Jean-Hugues Gros, há mais de dez anos titular da enologia da casa, e a Laura Regueiro, Senhora do Douro. Aconselho a secular harmonização duriense com vitela assada, pois claro.




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