Quanto mais o tempo passa e dá lugar a novas vindimas, mais material vamos tendo para fazer uma palpação real e autêntica da produção nacional e do que está a acontecer no terreno. Podemos e devemos estar orgulhosos. Temos por exemplo um especialista – Tiago Macena – que é o primeiro a atingir a difícil distinção para chegar a Master of Wine em Portugal e que continua a disponibilizar vinhos feitos à medida do seu talento e criatividade, desta feita com um Syrah do Dão. A Ramos Pinto colocou no mercado uma nova referência do grande clássico Duas Quintas Reserva, colheita de 2022. A grande Susana Tavares criou um maravilhoso Reserva branco na Quinta de Chocapalha, a quinta da sua família. Da região dos Vinhos Verdes, chega um Arinto brilhante da Quinta de Paços, que nos faz rever todo o preconceito que possa subsistir em relação à região. O Monte da Carochinha produziu um Merlot na Península de Setúbal que encanta e canta o Atlântico. Em Trás-os-Montes, Valle Pradinhos colocou no mercado o que pode bem ser o melhor Reserva da sua longa história. De Borba, chegou um Trincadeira fantástico, em solos de sequeiro. De Estremoz, damos conta de um branco de truz. Da ultra-clássica Casa de Santar vem um novo Reserva que confirma a história. E do Douro muito especial da Quinta Senhora da Graça, chega mais um grande Reserva tinto. O mercado está a mexer e é reconfortante perceber como se pode ser moderno sem deixar fugir o clássico. Boas provas.
Republicano
Dão tinto 2022 (13%) | No Rules Wines. 35 euros
Pontuação: 17,5/20
Tiago Macena tem aqui mais um vinho irreverente, produzido exclusivamente a partir da casta Syrah. A alegoria implícita no título é a da libertação do regime outrora vigente em direção à república, o que aplicado à enologia e criação de vinhos se pode ler como renúncia a regras demasiado rígidas; emancipação, portanto. No entanto vinho sem regras não é possível, como se imagina e aceita. Mesmo passados vários anos desde que a casta começou a ser explorada, ainda encontramos novas expressões, o que só pode ser sinal de adaptação aos terroir português.
Duas Quintas Reserva
Douro tinto 2022 (13,5%) | Adriano Ramos Pinto. 41 euros
Pontuação: 18/20
Vinho composto pelas castas Touriga Nacional (75%), Touriga Francesa (18%) e Tinta da Barca (7%), uvas provenientes das quintas de Ervamoira e Bons Ares. As primeiras foram vinificadas em lagares de granito, enquanto as da Quinta de Bons Ares fermentaram em cubas de betão e madeira. Fermentação malolática em tonéis, estágio em tonéis e em barricas novas de carvalho francês. Um clássico nacional, com uma carrreira brilhante e gloriosa desde o dueto 91/92, que marcou o início da era moderna do vinho português em geral e do Douro em particular.
Chocapalha Reserva
Lisboa branco 2023 (13%) | Quinta de Chocapalha. 16 euros
Pontuação: 17,5/20
O talento de Sandra Tavares não tem limites ainda conhecidos, com diversos vinhos – senão todos – a atingir notoriedade. Este lote de 75% Chardonnay e 25% Arinto é expressão pura de Chocapalha e é vinho para guardar religiosamente em cava, pois tem pelo menos uma década para evoluir e mostrar novos cambiantes. As cozinhas de inspiração oriental irão muito bem com este branco e por cá os créditos não ficam em mãos alheias, harmonizando na perfeição com uma boa e clássica feijoada. Para se mostrar na plenitude, não o sirva demasiado frio.
Casa de Paços Reserva Arinto
Verdes branco 2022 (13%) | Quinta de Paços. 14 euros
Pontuação: 17/20
Uvas de vinhas velhas, com a patrimonial casta Arinto a pontificar e a fazer a justiça de se confirmar como grande casta nacional. Não se trata de a consagrar apenas nos territórios graníticos e altaneiros da região dos vinhos verdes, mas antes de a prezar pela flexibilidade enológica e por se deixar moldar pelo talento de quem a produz, A Quinta de Paços não cessa de surpreender, representando com este vinho o zénite do sabor, textura e frescura de que a casta é capa. E dado o preço, dá vontade de encher a cave com este Arinto, dará muitas alegrias a todos.
Monte da Carochinha Grande Reserva Merlot
Setúbal tinto 2019 (14.5%) | Sociedade Agrícola da Carochinha. 25 euros
Pontuação: 17,5/20
Produzido no Monte da Carochinha, propriedade situada junto à Sonega entre as freguesias do Cercal e de Sines, este monovarietal beneficia de forte influência atlântica conjugada com um microclima de serra, onde os declives acentuados em solos pobres, de xisto, rodeados de floresta e esteva, marcam o seu perfil. Surpreende pela originalidade requintada e também pela recuperação da casta Merlot enquanto monovarietal. A proximida de atlântica é notória, exibindo notas salinas e ao mesmo tempo terrosas, graças à interpretação do genial enólogo Filipe Sevinate Pinto.
Valle Pradinhos Reserva
Trás-os-Montes tinto 2022 (13,5%) | Maria Antónia Mascarenhas. 15 euros
Pontuação: 18/20
Quem nunca foi até aos vinhedos do Casal de Valle Pradinhos, nos cocurutos nordestinos de Portugal, deve prontificar-se a fazê-lo. Está-lhe reservada uma enosurpresa que jamais irá esquecer. Solos muito pobres, paisagem quase lunar, as vinhas configuram caso de estudo para os que as trabalham. Depois, há uma diversidade de castas ali plantadas, algumas únicas na região de Trás-os-Montes, elevando ao nível do exotismo a experiência. A base deste néctar é Touriga Nacional, Tinta Amarela e Cabernet Sauvignon, e o céu é o limite.
Mamoré de Borba Vinhas de Sequeiro Trincadeira
Alentejo tinto 2020 (14,5%) | Sovibor. 40 euros
Pontuação: 18,5/20
Uvas provenientes de uma vinha velha de sequeiro com mais de 50 anos. Fermentação em lagar de mármore com pisa a pé. Estágio de 15 meses em barricas de carvalho francês de 300L e 500L. Esta casa tem património vitícola invejável e agora chegou o momento de lhe fazer a devida justiça, com a série “vinhas de sequeiro”, que agora inicia. Numa altura em que os recursos hídricos são muito escassos na região, está aqui um demonstrador de como os que nos precederam conheciam bem os solos e as uvas. Um Trincadeira a todos os títulos exemplar.
Aliestre One
Alentejo branco 2023 (12,5%) | PMC Wines. 15 euros
Pontuação: 17/20
Arinto e Roupeiro. Fermentação em inox. A marca pertence à PMC, mas o talento e know-how são da dupla imbatível Inês Capão e Luís Louro, assim como as vinhas, em Estremoz. A casta Arinto sente-se bem no lote, emprestando a frescura e a acidez que espera, com o bónus da componente floral que nestas latitudes é menos frequente. A casta Roupeiro está neste vinho com particular vigor, revelando uma faceta menos conhecida. Um vinho carregado de história e ao mesmo tempo cheio de futuro. Excelente para um bem alentejano ensopado de borrego.
Casa de Santar Reserva
Dão tinto 2017 (14%) | Global Wines. 16 euros
Pontuação: 17/20
Estamos perante uma marca secular da região do Dão, onde está lavrada muita da sua história. Nesta edição, a empresa engarrafou 150 mil garrafas deste vinho, mantendo-lhe viva a aura e o conteúdo. O perfil industrial representa um esforço considerável de inovação, que o Dão merece e precisa. Além disso, dá felicidade a mais consumidores. Produzido a partir de Touriga Nacional (50%), Alfrocheiro (25%) e Aragonês (25%) é referência de modernidade e sinal de até onde um clássico pode ir. Estágio parcial em barricas de carvalho francês. Excelente com arroz de pato.
Pedro Milanos Reserva
Douro tinto 2021 (14%) | Maria Luísa Valente. 30 euros
Pontuação: 18/20
Este vinho tem a mão de génio a que Vasco Valente Lopes já nos habituou e que me faz deter e provar com redobrada atenção. Estou à espera do dia em que saia da prodigiosa Quinta Senhora da Graça um vinho que me faça mudar de ideias, mas até hoje isso não aconteceu. Produzido a partir de Touriga Nacional e Tinta Roriz, este Reserva é um colosso, que muitos não conhecem ainda. É a um tempo muito elegante e encorpado, taninos muito finos e trabalhados à maneira da filigrana, resultando num vinho muito eficaz à mesa e com muito sabor. Excelente com vitela assada.