Os dois alegres pastores-belgas Shira e Saiko apressam-se a ir cumprimentar, curiosos, quem entra na Quinta dos Sentidos para visitar a adega. Os animais são a companhia diária de Beat Buchmann, de 69 anos, natural de Zurique, e Charlotte Toubro, 72, dinamarquesa, pelo menos desde que deixaram para trás o cinzentismo da banca suíça em busca de “um lugar ao sol” no sul de Portugal. Sem saber onde nem o que procurar, depararam-se com nove hectares de um terreno abandonado há décadas, cujas ruínas e mato alto não faziam adivinhar o seu potencial.
Ambos queriam, porém, apostar na construção de uma adega boutique, área pela qual Beat se interessou, ainda jovem, ao fazer uma vindima em Bordéus. Com o clima ameno do lado deles, segurança e poder de investimento, foram assentando pedra sobre pedra até plantarem a vinha inicial e lançarem o primeiro vinho, em 2016, seguros de que todo o esforço viria a trazer frutos. André Palma, farense e com 12 anos de experiência um pouco por todo o mundo, juntou-se ao projeto há ano e meio, mas fala com tanta paixão, que é quase como se ele lh pertencesse.
As vinhas dispõem-se em quatro hectares em colina – apenas um de castas brancas – e vivem em solos calcários cobertos pelo arenito avermelhado do grés de Silves, rodeadas de oliveiras e pomares. Entre os vários tipos de visita, o mais sensorial é aquele que inclui um passeio pelo jardim botânico com mais de 110 especiarias de todo o mundo e árvores de frutos, 40 delas de citrinos. Lima-caviar australiana, pimenta-rosa do Perú, figo-da-Índia, banana da Madeira, limão do Brasil, diospiro-negro do México e ameixa da África do Sul conferem cor e perfume ao lugar.
“Praticamos uma abordagem eco-sustentável integrada da agricultura e temos a biodiversidade como elemento-chave”, explica o enólogo, defensor de uma enologia pouco interventiva e cujo processo é controlado internamente da vinha à expedição. Das dez referências, batizadas com os nomes dos cinco sentidos, a primeira a ir para o mercado foi o Tato Tinto 2018, um “clássico intenso, mas equilibrado”, diz o produtor. Durante a prova na adega também se provam o Visão Rosé, “versátil, exótico e seco”, e o Essência Late Harvest de touriga nacional, da atual safra.
Enquanto os vinhos, produzidos à razão de 12-14 mil garrafas por ano, são expedidos para os restaurantes de gama média-alta e garrafeiras especializadas, o casal produz verjus (sumo de uvas não maduras e sem açúcar) e azeites virgens extra. Charlotte dedica-se, particularmente, ao jardim com 220 espécies de plantas e flores de todo o mundo, polinizadas pelas abelhas da Quinta dos Sentidos. Neste caleidoscópio sensorial cabem também um ecossistema aquático, bom local de piqueniques, um hectare e meio mantido selvagem e coelhos, cobras e perdizes.
Longitude : -8.2245