Enquanto houver estrada para andar… nós vamos de clássico

Esta é a época das road trips por excelência. De carro, de mota - num Triumph de 1962 - qualquer meio de transporte é bom para redescobrir Portugal. Neste caso, de Cascais a Peniche, pela N247. Para fazer sem pressas, ao ralenti.

«Posso ligar para ouvir o barulho do motor? Que maravilha», diz Alex, dono da Alex Surf School, no Baleal, concelho de Peniche. «Também tenho um clássico. Um Opel Rekord», continua. E não só. A carrinha da escola é uma Bedford, devidamente recuperada. «Deve ser fantástico fazer uma viagem por Portugal num carro desses», conclui, antes do regresso ao mar.

É, de facto, uma experiência única fazer uma viagem num Triumph Herald, de 1962. Ainda por cima cabrio. O sol, vento, o azul e o verde quase sempre no horizonte, tudo parece conjugar-se para criar o cenário perfeito. Demasiado perfeito, dirão alguns, até porque ter um clássico não está ao alcance de todos. Agora está, pelo menos durante algumas horas. Há muito que era possível alugar carros antigos para ocasiões especiais, com os casamentos no topo da lista, mas desde o final do ano passado o processo tornou-se mais acessível e democrático, através da plataforma BookAclassic.

Não se pense, contudo, que esta é condição essencial para uma road trip. Talvez a experiência seja (ainda) mais completa – e uma boa forma de fazer “amigos”, até porque quase ninguém fica indiferente a este postal com rodas – mas se há algo que Portugal tem de sobra é precisamente estradas cénicas. Como a N-247, entre Cascais e Peniche.

É um percurso com menos de 100 quilómetros que, à velocidade certa, se estende por um dia.

 

 

Um percurso com menos de 100 quilómetros que, à velocidade certa, se estende por um dia. O Núcleo de Interpretação da Duna da Cresmina, junto à praia do Guincho, pode muito bem a ser a primeira paragem. Tem um percurso de passadiços onde é possível conhecer a fauna e flora da zona. Ou apenas tomar um café com vista, até porque a estrada chama. E sobe, rumo ao Cabo da Roca, naquele que é um dos troços mais cénicos de toda a estrada. A Serra de Sintra de um lado e o Atlântico do outro.

Ultrapassado o fim da Europa começa a descida. E as dúvidas. As placas e as praias insinuam-se, a Adraga, a Praia Grande, a Praia das Maçãs, as Azenhas do Mar ali ao lado, Colares e Sintra, a sempre bela Sintra. Alguns quilómetros à frente, já no Oeste, a Ericeira também clama por atenção. O percurso ainda mal começou e a vontade de agarrar tudo é muita. Onde ir? Quando parar? Os dilemas típicos da estrada. Parar, parar e sair da rota sempre que apeteça, ou, pelo contrário, não ter “medo” de seguir em frente e passar ao lago de alguns destinos obrigatórios, tudo é válido numa road trip. O segredo está em não traçar um roteiro demasiado rígido. Se bem que ter um objetivo em mente não seja crime, neste caso o Clube Naval da Praia da Assenta. A gastronomia é sempre uma boa forma de marcar o ritmo e manter o foco.

É um daqueles segredos mal guardados que toda a gente gosta de continuar a conservar como seu. Até há bem pouco tempo a descida fazia-se numa estrada em terra, íngreme, de encontro a um pequeno porto onde ainda resistem algumas barracas de pescadores. Está melhor, agora. As mesmas barracas onde Deolinda Alves e o marido guardavam o material da faina. «A lota ficava no edifício onde agora é o restaurante. Como não havia nada à volta começou-se a fazer uns petiscos, depois umas caldeiradas e cá estamos. Parece que foi ontem», suspira.

Parar e sair da rota sempre que apeteça, ou, pelo contrário, não ter «medo» de seguir em frente e passar ao lago de alguns destinos obrigatórios, tudo é válido numa road trip.

Foi há quase 20 anos, em 1998. O boca a boca espalhou a chama do peixe da casa um pouco por todo o lado, por todo o mundo, «temos estrangeiros que chegam aqui com o nosso cartão, que lhes foi passado por amigos», as mesas foram-se enchendo, mas a qualidade não se perde. Logo à entrada o cliente é convidado a escolher o peixe, ao peso, e só depois se senta. Peixe graúdo. Garoupa, corvina, pargo, sargo, robalo, cherne ou pampo. «Não vendo sardinhas, nem carapaus». Tudo peixe fresco, servido apenas quando é bom. «O meu marido conhece muita gente no mar e só compramos o melhor», conclui antes de levar a corvina para a cozinha. Pouco depois está na mesa, acompanhada de batata e salada mista. Irrepreensível. Até parece fácil.

De volta à estrada, a paisagem é cada vez mais saloia. O mar e os campos em permanente diálogo; o clima com uma aura, vento e vontade próprias; uma serenidade quase absoluta, mesmo no começo da época alta. Faz-se um desvio de encontro ao Noah, na praia da Física – bar/restaurante que se tornou no ponto de referência de Santa Cruz – e uma paragem, mais uma, para colocar um pão com chouriço na cesta do piquenique do Triumph, e regressa-se à N-247 até Peniche, o final da rota, ao final do dia, com passagem pela Lourinhã e a Praia da Areia Branca.

Ir a Peniche é obrigatoriamente ir ao Baleal, península/paraíso para todos os surfistas, sobretudo para os os principiantes. Na água há dezenas (centenas?) de pranchas. Uma terra que vive à volta do surf. Talvez demasiado, diz Luís Cunha, dono da Hangfive – Surf Culture & Food. «Não quero parecer conservador, mas a modalidade transformou-se num negócio. Nem todos vêm ao Baleal pelo espírito do surf, mas sim porque encontram um pacote barato. Fazem umas aulas como poderiam fazer outra atividade qualquer», diz. Não fala com mágoa, antes a preocupação de que não quer ver a sua terra adoptiva ir na corrente. «Vivia em Alcobaça, trabalhava num ginásio, adorava surfar, mas passava imenso tempo ser ir ao mar, até que um dia tive um problema de coração. Já conhecia o Baleal há muitos anos e pensei: porque é que eu não venho viver para aqui?». Juntamente com a mulher começou por abrir uma mercearia, mas o negócio foi evoluindo para uma loja onde tanto é possível comprar uma prancha de autor, ténis feitos à mão com material vindo do Peru, uma ilustração de uma artista da terra ou beber uma cerveja. Artesanal. «Talvez pudesse ganhar mais direito de outra forma, mas é assim que estou bem. Trabalhar em grupo, com amigos, ter a possibilidade de pegar na prancha e colocar um papel a dizer: volto já», conclui.

Reportagem publicada originalmente na revista Evasões semanal, em junho de 2017.

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