Descobrir Ponte da Barca com o Rio Lima aos pés

Património natural e edificado, tradições, boa mesa. Não faltam motivos para visitar este concelho de traços rurais abrangido pelo Parque Nacional da Peneda-Gerês. Das margens do Rio Lima aos mosteiros. Devagar, como se quer.

Vera Bettencourt vivia em Lisboa antes de se mudar para Ponte da Barca. Decidiu mudar de vida porque «queria usufruir das coisas sem pressa». Objetivo alcançado: «Aqui temos paz, tranquilidade, tudo anda muito devagar», garante ela, que conduz os destinos do restaurante e loja Vai à Fava, no centro da vila, tendo como sócia Catarina Costa. «Como a Barca não há», prossegue. E a expressão ganha mais sentido quando se chega à esplanada com vista para o rio Lima e para a ponte tardo-medieval.

O Vai à Fava abriu em 2014, pela mão de João Bettencourt, irmão de Vera, como lugar de petiscos. Ainda se pode lá picar crepes de sardinha ou linguiça assada, mas o leque abriu-se e agora acolhe uma cozinha contemporânea, um pouco de toda a parte. Caril de camarão, bife de alheira e strudel de vegetais são algumas propostas, numa ementa composta por cinco pratos de carne, cinco de peixe, opções vegetarianas e saladas, além de entradas e sobremesas caseiras.

Mas ir ali «é muito mais do que comer; é uma experiência», sublinha Vera Bettencourt, que também está ligada ao desporto e se tornou na primeira mulher a presidir à Associação Desportiva de Ponte da Barca. É difícil não lhe dar razão ao entrar naquela casa, com mobiliário que foi de escola e tribunal, um piano e uma sala de refeições que serve de montra para compotas, vinhos, chás, especiarias, louça. Mesmo os pratos em que se come, com flores ou pássaros, podem ser adquiridos. E há que aproveitar, pois o Vai à Fava só funciona entre março e outubro. Quanto ao nome, queriam que tivesse ligação à zona, ao verde, à terra, e que fosse uma expressão que ficasse. Ficou.

Bem perto dali existe outro sítio que combina comida e compras, numa vertente mais tradicional. O Fumeirinho da Barca é uma loja de trajes folclóricos, artesanato, produtos regionais, como mel e vinho, e um sem fim de lembranças e outros objetos, propriedade de Manuel e Conceição Gomes, a que se junta outro negócio familiar: dentro da loja há uma passagem para a Taberna São João, inaugurada num 24 de junho, dia de S. João, padroeiro da vila, com entrada pela rua com o mesmo nome.

Naquela tasca castiça, com ramos de loureiro à porta, leva-se algum tempo a admirar os pormenores que enchem paredes e tetos. Um pouco por toda a parte, há recortes de jornal afixados com humor. Também se vê utensílios agrícolas, moedas de escudo e mensagens como «se bebes para esquecer paga antes de beber». A alheira de carne cachena e o entrecosto borracho (cozinhado em vinho verde tinto) são duas das especialidades, a acompanhar, por exemplo, com champarrião de vinho verde tinto ou branco, uma bebida que mistura de vinho, cerveja e açúcar.

Vinho e alheira no Fumeirinho da Barca. (Fotografia de (Cristiana Milhão/GI)

 

Música no património do Alto Minho

As paisagens, a comida, o vinho e as tradições são razões fortes e distintivas para visitar Ponte da Barca, resume o presidente da Câmara Municipal, Augusto Marinho, que quer ver o concelho como centro do turismo de natureza e aventura, aproveitando o facto de ter «rio, albufeira e montanha» e ser um dos cinco municípios abrangidos pelo Parque Nacional da Peneda-Gerês.

«Quem vier cá pode encontrar sítios fantásticos, muitos deles escondidos, muito pouco visitados», assegura Marinho, finalizando com um argumento de peso: o bem comer. A atestá-lo estão a posta barrosã e a lampreia – que «quando chega a Ponte da Barca é mais batida, mais rija, porque teve de fazer um esforço maior» na subida do Lima, «um rio mais rápido, com mais pesqueiras».

Já os locais a não perder, segundo o autarca, vão das margens do Lima até ao património edificado. «Ponte da Barca é o concelho mais pequeno do distrito de Viana do Castelo e tem três monumentos da mesma tipologia», reforça David Martins, produtor do Sente a História, um programa que leva concertos a monumentos do Alto Minho (ler caixa).

Trata-se de mosteiros «muito bem preservados», o mais longínquo a cerca de cinco quilómetros da vila. Tão curtas são as distâncias, que o circuito do românico em Ponte da Barca, com passagem por Bravães, Vila Nova de Muía e Crasto, pode ser feito numa tarde. Uma das paragens é no Mosteiro de São Salvador de Bravães, do qual se conserva a igreja, Monumento Nacional. Segue-se o Mosteiro de Santa Maria de Vila Nova de Muía, Imóvel de Interesse Público. E, por fim, o Mosteiro de São Martinho de Crasto, de que restam o adro e a igreja, também classificada como Monumento Nacional.

 

Um capitel ao contrário nas imediações do mosteiro

Mesmo ao lado do Mosteiro de São Martinho de Crasto fica a Quinta da Mata, em cuja entrada se lê uma data: 1817. É Hélder Rodrigues, que lá vive com a mulher, Natália Pereira, quem aponta aquele e outros pormenores curiosos, como uma coluna que «pertenceu ao mosteiro» e cujo capitel «está ao contrário», não se sabe como lá foi parar. David Martins já havia referido, no âmbito do programa Sente a História, que, não raro, a população em redor de monumentos daquele género usava pedras dos mesmos para as suas construções.

«A Quinta chegou a ser desmembrada em sucessões da família. Há cerca de 40 anos, os pais da minha esposa compraram-na, aproveitaram para a reunificar e começaram a trabalhar na produção de vinho», lembra Hélder. Entretanto, a propriedade ficou a cargo dele e de Natália, que decidiram modernizar a vinha (atualmente, produz-se lá uva para vinho verde) e disponibilizar duas casas para quem quiser ficar naquele lugar com japoneiras centenárias, um tanque com peixes e um gato pachorrento, chamado Dinis.

Além da Casa da Vinha, um T2, há a Casa dos Frutos Vermelhos, um T3 nascido a partir de uma adega. Famílias ou grupos que desejem «passar uma semana longe da confusão» são quem mais ali chega, por exemplo, para fazer trails e caminhadas ou conhecer o Parque Nacional da Peneda-Gerês. «Ponte da Barca é um reduto do Alto Minho muito rural ainda, com tradições bastante vincadas, e tem muitos pontos de interesse na perspetiva histórica e de natureza», diz Hélder, que costuma recomendar passeios no centro da vila, «reabilitado e muito bonito, principalmente à beira-rio».

Um dos bungalows do Lima Escape. (Fotografia de Cristiana Milhão/GI)

Leite-creme queimado na hora e bungalows

Aceitando o conselho de rumar ao centro da vila banhada pelo Lima, com margens limpas de carros, é natural que apeteça dar umas braçadas na praia fluvial e, a seguir, recuperar energias noutro local associado à água: O Moinho, um restaurante de pratos regionais onde funcionou um moinho. O espaço foi convertido em tanques de água corrente do rio Vade (afluente do Lima) para as lampreias, que, na devida época, atraem ali gente até dos Açores, conta Luciano Meireles. Enquanto ela não chega, serve-se posta de vitela barrosã, bacalhau à lagareiro, arroz de cabidela de frango pica no chão (à quinta-feira), cabrito assado em forno a lenha (ao domingo) e «leite-creme caseiro queimado na hora».

Boa mesa, natureza e sossego, reitera Luciano, são marcas de um concelho que «não está tão saturado de turistas como os vizinhos». E essa tríade é bem visível no Lima Escape, no Parque de Campismo de Entre Ambos-os-Rios, dentro dos limites do Parque Nacional da Peneda-Gerês. A gerente Anna Altshul, russa que se encantou por Portugal, procura fomentar a ligação dos clientes à natureza, mantendo a esplanada sem outra música que não a das aves, e optando por não ter televisão nem internet nos bungalows e tendas de glamour (duas tipi e duas bell tents).

Quem quiser ficar naquele parque em forma de coração, que pulsa em ligação estreita com a água (canoagem ou stand up paddle são atividades ali praticadas), tem ainda a possibilidade de dormir na casa do pastor, um T1 sobre rodas, na casa da floresta, uma moradia T1+1, ou fazer campismo tradicional, em tendas e caravanas.

Já o pôr-do-sol no Rio Lima é um espetáculo ao alcance de qualquer cliente, independentemente do tipo de alojamento escolhido. O mesmo para as sombras e para as refeições da Adega do Artur, ambas abundantes. O restaurante tanto serve pratos tradicionais como vegetarianos, além de outros ajustados à estação quente. Porém, nem todas as sugestões se encontram na ementa. Algumas são dadas por Anna a viva voz e implicam movimento. Visitar a aldeia de Lindoso, com o seu castelo e um conjunto de mais de 50 espigueiros, alguns do século XVIII, a cerca de 15 quilómetros do Lima Escape, é uma delas. E prova suficiente do muito que há por descobrir naquele território impregnado de verde e calma.

Algo está a fazer com que o sistema não consiga mostrar a ficha ténica desejada. Pedimos desculpa pelo incómodo.

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