Conhecer o Porto pela história das suas águas

Self-Portrait as a Fountain, escultura de Julião Sarmento, no Parque das Águas, Porto (Fotografia de Pedro Granadeiro)
Longe da azáfama turística do Porto, o Parque das Águas, no Bonfim, é um espaço de tranquilidade, onde é possível passear e meditar ao som da água a correr, e onde se fica conhecer uma importante parte da história da cidade.

Quando se entra na arca de água de Santo Isidro, o som da água a correr abafa tudo à volta. “É um ponto de meditação aqui no parque. Se ficarmos em silêncio, o som ecoa e não se ouve nada de fora. Uma vez, um senhor até gravou o som para meditar em casa”, conta Débora Silva, técnica de património e guia de visitas do Parque das Águas, especializada em história da arte.

Esta microarquitetura do século XIX encontrava-se na Rua de Santo Isidro e servia de ponto de ligação entre os mananciais e as fontes de abastecimento direto da cidade. Surpreende pela tranquilidade que transmite e pela estética. É revestida de azulejos do século XIX e a bica é ornamentada por uma cara em relevo, de referências orientais. “Parece um samurai.”

Arca de água de Santo Isidro (Fotografia de Pedro Granadeiro)

A arca de água encontrou morada no Parque das Águas, no Bonfim, tal como as fontes e outros elementos ligados à distribuição de água, espalhados por este jardim oitocentista sobranceiro ao rio Douro. “Os SMAS [Serviços Municipalizados de Agua e Saneamento, atual Águas e Energia do Porto] foram criados em 1927 para substituir a francesa Compagnie Générale des Eaux”, relata Débora. “Sediou-se aqui, numa quinta do século XIX conhecida como Quinta das Oliveiras, que pertencera a famílias da alta burguesia portuense que tinham enriquecido com o comércio com o Brasil.”

Desde logo, tiveram uma preocupação, “até precoce”, de preservar o património. “Esta coleção começou a ganhar forma nos anos 1930, a mesma década em que saiu a primeira carta internacional para a preservação do património.” A cidade estava a crescer e muitas fontes deixaram de ser necessárias e foram demolidas. “As que eram vistas como tendo valor artístico foram reconstruídas na mata dos SMAS, que depois se chamou Jardim de Nova Sintra, e é atualmente Parque das Águas.”

A mais antiga é do século XVI e era a fonte do claustro do Convento de São Bento de Avé-Maria, demolido para se construir a Estação de São Bento. “O chafariz, que estava no centro da vida quotidiana das freiras, é de autoria do mestre pedreiro que impulsionou o Renascimento no norte de Portugal e na Galiza, João Lopes, o Velho”. Caras de anjos sobressaem na decoração.

Passeando pelo jardim, que preserva o desenho e o chafariz original, encontra-se também um bebedouro em ferro fundido mandado produzir para a Sociedade Protetora dos Animais, criada na segunda metade do século XIX.

Fonte do século XVI, da autoria de João Lopes, o Velho (Fotografia de Pedro Granadeiro)

Mas o jardim não parou no tempo. De 1987, quando abriu ao público, é Universo 4+3, escultura de Irene Vilar. E para celebrar a requalificação de 2017, Julião Sarmento desenhou a escultura Self-Portrait as a Fountain, “uma citação direta à obra do artista norte-americano Bruce Nauman, de finais dos anos 1960”. Há também um mural de arte urbana que junta vários artistas.

Quem passear pelo Parque das Águas nos próximos meses encontrará, no meio da mancha de eucaliptos centenários, a escultora Micaela Couto, trabalhando a raiz de um exemplar que teve de ser abatido. De resto, caminhe-se ao som da água, tranquilidade só interrompida esporadicamente pelo som do comboio a passar junto ao rio.

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