Um roteiro pela água que move Paredes de Coura

Cascatas, ribeiros, regatos, fontes, lagoas. Água é o elemento dominante para um roteiro pelas paisagens deste território do Alto Minho. Sempre em torno do Coura, para onde parece fluir toda a vida, no coração do concelho minhoto.

O caminho de terra batida segue o curso de água até um pequeno aglomerado de casas em granito. Um «bom dia!» enérgico irrompe o som da corrente. Quem recebe os visitantes é Manuel Barbosa, o moleiro da terra e dono do último moinho em atividade em Paredes de Coura. Há 40 anos, não lhe faltavam clientes, mas entretanto conformou-se à evolução tecnológica que tornou praticamente obsoletos os velhos e resistentes engenhos. Hoje, poucos trituram os seus cereais nesta mó que ainda roda com vigor e que Manuel, apesar dos 87 anos de idade, ainda manobra com destreza. «De vez em quando, ainda vem cá gente moer farinha, para fazerem o pão que é servido nas matanças das freguesias do lado.»

Das cinco mós que compõem o COMPLEXO DE MOINHOS DE CASALDATE, apenas uma permanece em funcionamento. Um ligeiro puxar de um cordel, dois punhados de milho atirados para a adelha e em poucos segundos o aroma invade a pequena casa granítica que ali se ergue há três séculos. Dessa farinha nasce a broa – normalmente de milho, cereal abundante nesta terra apelidada de «celeiro do Minho» – que pode ser feita por qualquer pessoa, com a experiência Sabores da Terra da COURA AVENTURA, que promove visitas guiadas a este marco do concelho.

A água é a força motriz de toda esta atividade. Já desativada, a serração onde Manuel trabalhou décadas na carpintaria e também ela movida pela força da corrente, está agora inerte. Não por culpa das águas do Coura, que continuam a correr. É ali que nasce o rio, a poucos metros de Casaldate, no encontro das águas da ribeira de Cavaleiros e do regato de Reiriz – o ponto de partida ideal para um percurso pelo ciclo da água que marca Paredes de Coura.

Em Casaldate mora o último moinho em atividade em Paredes de Coura, manobrado com destreza pelo moleiro da terra, Manuel Barbosa

A água é a alma do município minhoto de 10 mil habitantes. Os ribeiros brotam nas bermas e nos terrenos privados e irrigam a paisagem que se cobre de um verde intenso, de pastos povoados de vacas de raça barrosã. É das entranhas das formações graníticas que o povo se habituou a recolher a água de que necessitava, essencialmente para consumo. Uma das mais famosas nascentes pertence hoje à SALUTIS. Esta fonte centenária de Grichões, que os courenses procuravam pela extrema leveza da sua água, é comercializada pela empresa de água mineral que é hoje uma das marcas mais reconhecidas do concelho. A nascente que surge entre as formações rochosas é uma visão pouco comum e que pode ser observada no local, mediante marcação.

Manuel Barbosa ainda manobra com destreza o último moinho da terra (Rui Manuel Fonseca/GI)

Os cursos de água são também um viveiro natural para uma das especialidades gastronómicas de Paredes de Coura: a truta. Pode ser provada nos restaurantes locais, mas a cerca de dez quilómetros da vila a experiência é mais completa: na CASA DO XISTO, as canas de pesca artesanais estão ao dispor dos clientes, adultos e crianças, que podem apanhar trutas nos pequenos lagos do jardim. Maria Lucília, cozinheira e proprietária trata do resto. O peixe é preparado com perícia e chega à mesa grelhado e envolto num molho especial que é receita secreta da dona Cila. As couves caseiras e as carnes da criação própria de porco bísaro completam a ementa que serve ainda um leque de especialidades como o javali estufado com arroz das matanças e truta em escabeche.

Outra curiosidade: estamos em terra de chuva abundante e que tem uma das maiores taxas de pluviosidade do país. Um antídoto natural contra os fogos que raramente atingem proporções ameaçadoras nestes terrenos. É nos territórios adjacentes à vila, hoje um centro cultural vibrante, que se descobrem os segredos das riquezas da terra alimentada pelo Coura. Para ir ao encontro da génese deste rio que dá vida a Paredes de Coura é necessário percorrer a panorâmica Estrada Nacional 306 até ao coração da PAISAGEM PROTEGIDA DE CORNO DE BICO.

No restaurante Casa do Xisto, os clientes pescam as suas próprias trutas, que depois são preparadas segundo uma receita secreta da experiente cozinheira

Foi ali perto que o gado da região, de lampiões na cabeça durante a noite, afugentou as tropas espanholas durante a célebre batalha de Travanca, em 1662, julgando o invasor tratarem-se de soldados portugueses. Uma lenda, é certo, mas os bois e as vacas barrosãs continuam a percorrer as pastagens nas bermas do caminho que conduz ao ponto mais alto da paisagem, a 883 metros de altitude. Juntam-se a eles os cavalos selvagens, lebres fugidias atravessam a estrada e, longe da vista, escondidos nos arbustos que lhe servem de casa, uma alcateia de lobos ibéricos que as gentes da terra bem conhecem.

O amplo carvalhal de folhagem densa alonga-se pela paisagem pontilhada com enormes blocos graníticos, até ao curioso LAMEIRO DAS CEBOLAS, um terreno de turfa, algo pantanoso, que dá origem a um dos afluentes do Coura, o ribeiro dos Cavaleiros. Por ali, existem três pontos de observação da fauna local, que inclui o esquivo corço e a salamandra-lusitânica. Os troncos das árvores vestem-se com um musgo que aparenta pingar dos seus ramos – uma espécie que sobrevive apenas nos locais com ar puro.

Os cavalos selvagens passeiam livremente pela Paisagem Protegida do Corno de Bico (Rui Manuel Fonseca/GI)

Cerca de seis quilómetros a norte, o percurso conduz à antiga Colónia Agrícola de Chã de Lamas, criada pelo Estado Novo para fomentar a agricultura. É dali que através de um caminho de terra se acede à pequena LAGOA DA SALGUEIRINHA, a outra nascente do Coura, um charco de camada densa de nenúfares, vegetação farta e casa de inúmeras espécies. Entre elas, a víbora-de-seoane, uma das raras serpentes venenosas do país e espécie ameaçada.

Na estrada acidentada que percorre a paisagem protegida de Corno de Bico é comum encontrar cavalos selvagens, lebres e vacas barrosãs que pastam livremente na natureza

É daqui que parte o TRILHO DOS MOINHOS, percurso de oito quilómetros, um dos 17 trilhos municipais sinalizados, que termina precisamente nos moinhos de Manuel Barbosa. Um caminho adaptado a iniciantes e que se percorre em pouco mais de três horas. Completo o itinerário e o ciclo da água na génese do Coura, seguem-se as curvas e contracurvas do rio em direção à vila, onde a população e os milhares de visitantes mergulham nas águas frescas da PRAIA FLUVIAL DO TABOÃO, construída na década de 1990 e que é hoje uma das imagens de marca de Paredes de Coura, graças ao festival de música que ali acontece, sempre no mês de agosto.

Um pouco mais distante, perto de Infesta, descobre-se entre o denso arvoredo a CASCATA DAS LAGES ALTAS, onde o curso do ribeiro das Poldras, também ele afluente do Coura, se agita e finalmente cai sobre o enorme altar granítico por onde serpenteiam as águas. Um dos pontos altos do trilho de pouco mais de cinco quilómetros que recebe o nome da cascata. O adequado último capítulo do ciclo da água que dá vida a Paredes de Coura, das chuvas às nascentes naturais, para beber, cultivar, trabalhar. E, claro, mergulhar.

 

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