Mil hectares. Mil campos de futebol, mais coisa menos coisa. Uma imensidão de paisagem virgem alentejana. Pedro Vasconcellos e Souza tinha em mãos esta propriedade e sonhava, tal como o seu pai antes de si, fazer vinho deste chão rico em xisto e quartzo. Ele que se formou em Enologia, e exerceu em França, Chile, Uruguai, mas também no Dão – na Casa de Santar, também ela património da família.
O importante nesta história é que Pedro soube esperar. Tinha em mente um projeto de tal forma ambicioso que só encontrando os investidores certos poderia avançar. Pois, encontrou. E avançou. Sem pressas, dando sempre tempo ao tempo. Afinal, trata-se de uma terra que está na família desde sabe-se lá quando, terra essa que guarda património megalítico e vestígios da presença romana. E onde persistem algumas dezenas de oliveiras milenares, das quais a Herdade do Freixo pretende extrair um azeite «histórico», a lançar no mercado em anos próximos.
Perante este quadro alentejano, marcado pela presença próxima da serra de Ossa, foi ponto de honra que a adega não se impusesse como um corpo estranho na paisagem. A solução foi apontar para cima – ou melhor, para baixo: o edifício teria de ser subterrâneo. Mesmo que isso implicasse abrir um furo de 40 metros de profundidade para comportar os três pisos que o projeto previa.
À vista de quem passa pela vinha, ainda se notam as chaminés de respiração e os óculos que inundam de luz natural o interior da adega, mas só enquanto a vinha de Syrah que foi plantada na cobertura não atingir a fase adulta.
Por essa altura, o edifício estará completamente dissimulado na paisagem. Apenas um rasgo no monte e uma sala envidraçada denunciam a entrada. Começa-se por cima. A sala de boas-vindas é marcada pelo betão, mas também pelo xisto e pela madeira de carvalho, elementos-base que lembram distintas fases do próprio vinho – a adega, a vinha, o estágio.
Depois, começa-se a descer, esquecendo num instante, pela grandeza dos espaços e pela quantidade de luz natural, que se está debaixo do chão. O projeto de arquitetura, assinado por Frederico Valsassina, versou, acima de tudo, sobre a função: na chegada da uvas, no circuito que estas percorrem nas diferentes fases do processo (tudo feito por gravidade), na zona de estágio. E na própria vocação turística do projeto, uma vez que os visitantes conseguem sempre circular, sem riscos nem inconvenientes, mesmo nas fases de trabalho mais intensivo. O acesso a todos os espaços faz-se por uma rampa em espiral, com janelões providencialmente colocados para que não se perca pitada daquilo que se passa ao longo do processo.
De braço dado com toda esta funcionalidade, o arrojo e a elegância. Atributos que também estão inscritos no ADN dos vinhos que aqui se faz. «Vinhos elegantes, com frescura e mineralidade», foi esse o ponto de partida que Pedro propôs a si mesmo. Um perfil normalmente mais associado a vinhos do Norte. «Mas mantendo a estrutura e o corpo, tipicamente alentejanos, e um grande potencial de longevidade.» Para isso, teve de arriscar – risco calculado, entenda-se – em castas diferentes das habituais, porém adaptadas ao terroir.
Além do alicante bouschet e da touriga nacional, estão lá, nos tintos, o cabernet sauvignon e o petit verdot; nos brancos, arinto, alvarinho e sauvignon blanc, bem como uma vinha de riesling ainda em fase experimental. Resta falar de outro «ingrediente» essencial: o tempo. Vinhos jovens não estão nos objetivos da Herdade do Freixo; pressas, também não.
O processo de fermentação, desde logo, privilegia uma extração mais prolongada, com mais tempo de maceração. Depois, todos os vinhos são estagiados em barricas de carvalho francês, alguns com estágio adicional em garrafa, daí que só neste verão tenha chegado ao mercado a primeira colheita da casa, de 2014, para já em três referências: um tinto e um branco Freixo Reserva e o especialíssimo Freixo Family Collection Tinto.
Vinhos à altura de desafios culinários como queijos curados muito intensos, pratos de caça ou sobremesas adstringentes como marmelo assado. Aliás, já que se fala de mesa, a visita, em querendo-se, pode incluir almoço. Um almoço que é toda uma experiência, não só por servir de companhia à descoberta dos vinhos da casa como pelo cenário onde decorre, uma acolhedora sala forrada com madeira e debruçada sobre a magnífica cave de barricas. O melhor é mesmo vir com tempo.
Enoturismo
A modalidade de visita depende da motivação do visitante. Quem vem apenas pela arquitetura tem, até ao final do ano, percursos guiados gratuitos sem prova (45 minutos; a partir de 1 de janeiro, 3,50 euros). Quem vem com o vinho em mente tem três modalidades à escolha, consoante o número de vinhos provados (6,50/15/30 euros, com 1, 2, 3 vinhos), sendo certo que as duas modalidades mais caras incluem também visita comentada à vinha.
Em juntando o almoço, o preço sobe para 110 euros (mínimo seis, máximo 12 participantes; das 10h30 às 16h00), garantido utilização exclusiva da adega. Se o apetite apenas pedir petisco, são servidas a pedido tábuas de queijos e enchidos regionais (5 euros por pessoa). As visitas decorrem de segunda a sexta às 11h30 e às 15h00 (dado haver número limite de participantes, é recomendada a reserva), e ao sábado, por marcação.
Herdade do Freixo
Freixo
GPS: 38.6905, -7.6728
Tel.: 266094830
Web: herdadedofreixo.pt